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terça-feira, 25 de setembro de 2012

O mundo - Juan José Millás

    
O livro de Juan José Millás "O mundo", é uma autobiografia misturada a imaginação de um menino que viveu uma dura infância. Nele se confundem o que realmente aconteceu, com a imaginação do autor ao escrever o romance, que era para ser somente uma reportagem dele mesmo, 
 "de modo que comecei a me seguir para estudar meus hábitos. Nesses devaneios, um dia me disse: 'Meu pai tinha uma oficina de aparelhos de eletromedicina'. Então me apareceu a oficina, comigo e com meu pai dentro. Ele estava testando um bisturi elétrico sobre um pedaço de carne de vaca. Subitamente, me disse: 'Olha Juanjo, cauteriza a ferida no mesmo momento em que a produz'. Compreendi que a escrita, como o bisturi de meu pai, cicatrizavam as feridas no mesmo instante em que se abria e intuí por que era escritor. Não fui capaz de fazer a reportagem: acabava de ser atropelado por um romance."

     O livro conta a história de um menino pobre, com um monte de irmãos, que sofreu as dores da perda, da morte, do amor, das surras, da tristeza, da pobreza, do frio, da solidão, da decepção, enfim... Sobreviveu porque tinha imaginação, e a usava para fugir da vida real.
     "Depois de comer, entrava no vão da escada, que tinha também algo de nicho. Muitas vezes, o trânsito do sono à vigília era tão insensível como a passagem do estado sólido ao líquido no gelo. Teria a água memória do gelo? Guardava eu memória dos sonhos? Talvez não, porque ao despertar continuava neles."


     Teve um amigo, e juntos descobriram um pouco do colorido que possa talvez existir no mundo, "Lembro que passou a nosso lado um cachorro que observei como se se tratasse do primeiro cachorro da Criação. Nunca um animal dessa espécie havia reclamado minha atenção daquele modo. Ao parar para mijar, levantando a pata, nos observou assombrado da mesma forma que nós, que o observávamos. Quero dizer que se tratava de um assombro de ida e volta, um assombro que compartilhávamos com a normalidade com que compartilhávamos a rua, como se o cachorro e nós fôssemos extensões da mesma substância. O Vitaminas e eu nos olhamos e começamos a rir, mas seu riso e o meu eram também os mesmos. Tratava-se de um riso colocado no mundo para ser compartilhado."

     Viveu uma paixão de menino, um amor que nunca esqueceu. 
"Então compreendi de súbito que nos apaixonamos pelo habitante secreto da pessoa amada, que a pessoa amada é o veículo de outras presenças das quais ela nem sequer é consciente. Por quem teria que estar eu habitado para despertar o desejo de Maria José?"
     

O romance é maravilhoso, não perca a oportunidade de lê-lo de viver tamanha dor, pois "Às vezes, nos romances se infiltram fragmentos de realidade que deixam manchas de umidade, como uma goteira na parede de um quarto", e sentir tudo isso ao ler faz com que pensemos e recordemos a nossa própria infância, o nosso próprio amadurecer, e talvez percebamos que fomos feliz demais.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Sem jeito...

"- Bem, vejo que você está chateada. Jonas disse que você tratou Andrius mal. Isso não é justo. Às vezes a gentileza pode chegar de uma forma desajeitada. Mas ela é muito mais sincera nessa falta de jeito do que aqueles homens elegantes sobre os quais você lê nos livros. Seu pai era muito desajeitado.
    Uma lágrima rolou do meu rosto.
    No escuro, minha mãe deu uma risadinha.



    - Ele disse que eu o enfeiticei no mesmo instante em que pôs os olhos em mim. Mas sabe o que aconteceu de verdade? Ele tentou falar comigo e caiu de uma árvore. Caiu de cima de um carvalho e quebrou o braço.(...) Ele era tão desajeitado, mas tão sincero. Às vezes a falta de jeito pode ser muito bela. São o amor e a emoção tentando se expressar, mas na hora tudo acaba saindo sem jeito. O que estou dizendo faz sentido?
    - Arrã - respondi, tentando abafar as lágrimas.
    - Os homens bons muitas vezes são mais práticos do que bonitos - disse mamãe. - Andrius tem a sorte de ser as duas coisas."


A vida em tons de cinza - Ruta Sepetys, p.116





quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Cai chuva no céu cinzento

Cai chuva do céu cinzento
Que não tem razão de ser.
Até o meu pensamento
Tem chuva nele a escorrer.

Tenho uma grande tristeza
Acrescentada à que sinto.
Quero dizer-ma mas pesa
O quanto comigo minto.

Porque verdadeiramente
Não sei se estou triste ou não.       

E a chuva cai levemente                                           
(Porque Verlaine consente)
Dentro do meu coração.
Fernando Pessoa