sábado, 31 de março de 2012

Dor...


Me sentia triste, mas o que, exatamente, me deixava tão triste? ... A gente não vê a dor. Não pode vê-la, simplesmente porque a dor não é visível, em nenhuma circunstância. No máximo, podem-se ver alguns de seus mínimos sinais exteriores. Mas esses sinais sempre me pareceram máscaras, mais do que sintomas. Como pode o homem expressar a angústia atroz de sua alma? Chorando bicas e dando berros? Balbuciando palavras desconexas? Gemendo? Derramando umas poucas lágrimas? Eu sentia que todas essas possíveis demonstrações de dor só eram capazes de insultar essa dor, de menosprezá-la, de profaná-la, de colocá-la ao nível de amostras grátis... Acreditei entender que o que às vezes nos comove na dor alheia é o temor atávico de que essa dor se transfira para nós.
Livro: O segredo dos seus olhos, Eduardo Sacheri, p.33

quinta-feira, 29 de março de 2012

Ansiedade...


"Acho que foi por observá-lo que desenvolvi minha teoria de que os estúpidos se conservam melhor fisicamente porque não são corroídos pela ansiedade existencial à qual as pessoas mais ou menos lúcidas se veem submetidas."

Livro: O segredo dos seus olhos, Eduardo Sacheri, p.85

terça-feira, 27 de março de 2012

Será que também já fiz isso?

"...Todos vocês, do mundo seguro, com seus air bags, e suas embalagens hermeticamente fechadas e suas dietas livres de gordura. Vocês é que são supersticiosos. Vocês se convencem que podem tapear a morte, e se sentem absolutamente ofendidos quando descobrem que não podem. Vocês ficam sentados em seus apartamentos confortáveis e assistem a guerra, e nos vêem sangrando, pela televisão. E pensam: "Que horror!", e depois se levantam e tomam outra xícara de café expresso."

As memórias do livro, Geraldine Brooks, p.47

sexta-feira, 23 de março de 2012

COTOCO, O diário (perversamente engraçado) de um garoto de 13 anos


Por que será que tenho a sensação de que estou cercado de gente maluca? Dizem que o primeiro sintoma da loucura é achar que os doidos estão por toda parte... (Estou muito preocupado).
Livro: Cotoco, John van de Ruit, p.42

quinta-feira, 22 de março de 2012

Chuva...




Um perfeito dia para mim é assim -... – Uma manhã carregada de nimbos, alguns trovões e uma boa chuva o dia todo. Não digo um aguaceiro, porque os imbecis solares se queixam duplamente se a cidade se encher de água. Não, basta uma chuvinha constante que dure até a noite. Até tarde da noite, isso sim. Para a gente poder dormir com o ruído das gotas. E, se pudermos acrescentar mais uns trovões, melhor.
Livro: O segredo dos seus olhos, Eduardo Sacheri, p.45

terça-feira, 20 de março de 2012

Coisas da vida

O Salva-vidas
"...
Piegas ou não, forçado ou não, eu acho mesmo que os livros nos "salvam", de alguma maneira. Salvam a gente de levar uma vida besta, doutrinada pela TV. Salvam a gente de ficar olhando só pra fora, só para o que acontece na vida dos outros, sem nos dedicar a alguns momentos de introspecção. Salvam a gente de ser preconceituoso. Salvam a gente do desconhecimento, do embrutecimento, do mau-humor, da solidão, salvam a gente de escrever errado. Se existe salvador da pátria, não conheço outro.
..."
livro:Coisas da vida pg.129,  Martha Medeiros

segunda-feira, 19 de março de 2012

Não saber o que significa....ler.


Não estava preparada para a solidão. Não conhecia o consolo dos livros que a ele faziam companhia. Era uma grande diferença. No caso dele, a leitura chegara a ocupar um lugar jamais outorgado a nenhum ser humano. Por que perder tempo em inúteis conversações cotidianas quando podemos estar sempre em contato com os melhores e os mais instigantes pensadores de todos os tempos? Por que permitir que a vida seja ocupada por seres medíocres - atraentes, é verdade, mas de raciocínio fraco - , quando temos a possibilidade de visitar Platão, Sêneca e Proust? ...
...Mas como poderia descrever aquele universo amplo do pensamento em que se aventura a uma pessoa que nunca tinha aberto um único livro com prazer em toda sua vida, que não sabia o que isso significava?...
Livro: A jogadora de xadrez, Bertina Henrichs, p.78 e p.79

sexta-feira, 16 de março de 2012

Voz da noite


O sol se apaga.
De mansinho,
a sombra cresce.
A voz da noite
diz, baixinho:
esquece...esquece...

Helena Kolody - Sinfonia da vida, p.27

quarta-feira, 14 de março de 2012

Encontrei a resposta.... (Simone de Beauvoir)

"Elisabeth admira-se de que eu não seja ambiciosa. Mas a razão é essa, justamente: não
preciso conquistar um lugar privilegiado no mundo, pois parece-me que já estou
instalada nele.
Sorriu a Gerbert e comentou:
- Você também não é ambicioso.
-Não - respondeu ele. - Para quê?
Hesitou um pouco, depois prosseguiu:
- Mas gostaria de ser um bom ator.
- Tal como eu, que gostaria de escrever um bom livro. Gostamos de fazer bem o nosso
trabalho. Mas não pela glória, nem pelas honrarias."


(Simone de Beauvoir - A convidada, p.16)




A algum tempo, uma professora perguntou-me se eu era ambiciosa, respondi a ela que não, mas não soube lhe explicar direito o porque da resposta. Sempre fiquei pensando sobre esse assunto, mas nunca havia encontrado a resposta perfeita. Precisei ler Simone de Beauvoir para encontrá-lá, e tenho certeza que a minha colega Eliane compartilhará dessa opinião, não é mesmo?


E tem como não concordar de definição tão perfeita das angústias vividas por nós durante tanto tempo? lembrando que discutimos sobre isso constantemente...
Ler Simone de Beauvoir! Quantas descobertas e reflexões! E saber que este livro estava o tempo todo lá! Esperando para ser aberto...suplicando por atenção...em nossas estantes de relíquias, os quais relutamos muito em nos desfazer, agora acredito ser essa decisão muito sábia...Quantos tesouros ainda podem estar lá a nossa espera! 

Dia da poesia - 14 de março

      Não sei se a poesia é uma oração, um desabafo ou uma canção.
     Só sei que ao ouvir ou ler uma poesia, todo o meu ser se inunda de um sentimento tão bom, que ela me enche de sonho, de esperança e ilusão. 
     Por isso gosto de compará-la a um desabafo, mas quando penso melhor, acho que ela é uma canção, mas lá no fundo sempre acreditei que fosse sim, uma oração.
     Ah! Isso não importa.
     O que importa é que hoje é o Dia da Poesia, e isso quer dizer que estou mais inspirada ainda em ler poesias, por isso vou compartilhar algumas com vocês:


 Algumas poesias de poetisas maravilhosas. Tão maravilhosas quanto suas poesias.



Não digas onde acaba o dia.
Onde começa a noite.
Não fales palavras vãs.
As palavras do mundo.
Não digas onde começa a Terra,
Onde termina o céu.
Não digas até onde és tu.
Não digas desde onde é Deus.
Não fales palavras vãs.
Desfaze-te da vaidade triste de falar.
Pensa, completamente silencioso,
Até a glória de ficar silencioso,
Sem pensar.

(Cecília Meireles - Cânticos)


A vida é linda,
mesmo doendo
nos desencontros
e despedidas,
mesmo sangrando
em melogrados,
áridos hortos,
searas maduras
de sofrimento.

Chegar ao porto
da vida finda
cantando sempre
sonhando ainda.

(Helena Kolody - Sinfonia da vida, p.91) 


Sei lá! Sei lá! Eu sei lá bem
Quem sou? um fogo-fátuo, uma miragem...
Sou um reflexo...um canto de paisagem
Ou apenas cenário! Um vaivém

Como a sorte: hoje aqui, depois além!
Sei lá quem sou? Sei lá! Sou a roupagem
De um doido que partiu numa romagem
E nunca mais voltou! Eu sei lá quem!...

Sou um verme que um dia quis ser astro...
Uma estátua truncada de alabastro....
Uma chaga sangrenta do Senhor...

Sei lá quem sou?! Sei lá! Cumprindo os fados,
Num mundo de maldades e pecados,
Sou mais um mau, sou mais um pecador...

(Florbela Espanca)

terça-feira, 13 de março de 2012

Helena Kolody - Poeta Paranaense




Nós

        Fomos duas árvores castas
     Não misturamos raízes.
           Apenas enlaçamos os ramos
e sonhamos juntos.




       Helena Kolody - Sinfonia da vida, p.68

segunda-feira, 12 de março de 2012


“Ele já não contemplava o futuro ao longe
Ansiando por sua chegada
Tinha o futuro na palma da mão e apertava-a.”

O planalto e a estepe, Pepetela, p.182

quinta-feira, 8 de março de 2012

8 de março - Dia Internacional da Mulher


"Quem não se movimenta, não sente as correntes que o prendem". 

"Há todo um velho mundo ainda por destruir e todo um novo mundo a construir. Mas nós conseguiremos, jovens amigos, não é verdade?
                                                                                                                                              (Rosa Luxemburgo)


terça-feira, 6 de março de 2012

Existia...

“Ele respirou fundo como os grandes peixes
Deu voltas frenéticas nas águas profundas
Respirou devagar devagar
Enovelou o suspiro no espírito
Rompeu de pedra a porta
Ousou enfim olhar o futuro.
Existia.”
O planalto e a estepe - Pepetela, p.169

segunda-feira, 5 de março de 2012

Disputa


“Em tempos de muita fome e miséria, o leão e o elefante lideravam grupos rivais na procura ou da carne ou do capim. E se combatiam desesperadamente. Até que o cágado, conseguindo fazer ouvir a sua voz profunda do alto de um morro, lhes disse, estúpidas criaturas, chocam constantemente entre vocês e eu fico no meio, por isso a minha carapaça é tão dura, para resistir aos vossos choques de gigantes sem cérebro. No entanto, se conversassem, podiam chegar a um entendimento dividir a pobreza entre todos. Quando é para dividir as riquezas, tudo se torna fácil, não exige imaginação, só força. Mas dividir a pobreza é bem mais complicado, e por isso, vocês, cegos e estúpidos, pensam apenas em lutar para evitar  atingir o impossível. Vamos sentar à sombra de uma árvore e conversar. Encontraremos certamente a solução, o impossível morreu de velho.”

O planalto e a estepe - Pepetela, p.158

sábado, 3 de março de 2012

Helena Kolody - Poeta paranaense



"Vim da Ucrânia valorosa,
que foi Russ e foi Rutênia.
Vim de meu berço selvagem,
lar singelo à beira d´água,
no sertão paranaense.
Feliz menina descaça,
vim das cantigas de roda,
dos jogos de amarelinha,
do tempo do 'era uma vez..."


                                                        




Filha de imigrantes ucranianos, nasceu na cidade paranaense de Cruz Machado, em 1912, e passou a infância em Três Barras (SC).
Iniciou publicando seus poemas em jornais e revistas – então com 16 anos – e os primeiros livros foram publicados, na maioria, com seus próprios recursos.
Helena Kolody não se casou, e o foi para ela um sentimento inspirador, nunca concretizado, que transpareceu em seus poemas como um sonho, como algo doce e lírico.
Aos 80 anos passou a fazer parte da Academia Paranaense de Letras, sendo a segunda mulher a participar deste fechado círculo, antes reservado apenas aos homens.


quinta-feira, 1 de março de 2012

De perto ninguém é normal

“A onça deixada para trás no nosso trajeto de humanização  nunca se dilui completamente dentro de nós, por muitos livros lidos, viagens feitas ou debates intelectuais participados. Existe sempre uma unha ou dente de onça que se manifesta quando a ocasião é propícia. Somos considerados civilizados se somos capaz de o esconder sempre do conhecimento dos outros. Mas existe todavia um pedaço selvagem permanecendo de atalaia. E ao menor pretexto damos o bote.
            Somos de uma humanidade animal.”
O planalto e a Estepe, Pepetela, p.121
No, la pintura no está hecha para decorar las habitaciones. Es un instrumento de guerra ofensivo y defensivo contra el enemigo.
 ("Não, a pintura não está feita para decorar casas. Ela é uma arma de ataque e defesa contra o inimigo.")   Pablo Picasso, sobre Guernica  (Wikipédia)